sexta-feira, 8 de abril de 2016

4097) A Ciência numa frase (9.4.2016)



Richard Feynman, ganhador do Prêmio Nobel de Física, foi professor numa universidade carioca durante algum tempo. Era um cientista questionador, anticonvencional. Embora tivesse adorado o Brasil pelo seu espírito extrovertido, alegre, ele deu em seus livros de memórias um retrato muito pouco elogioso da educação brasileira. “A maioria dos universitários não são estimulados a pensar,” dizia ele, “tudo que querem é decorar fórmulas e aplicá-las nas provas, sem muito interesse pelo seu significado”.  Diagnóstico que bate com a minha experiência pessoal.

Propuseram a Feynman certa vez um problema conceitual. Digamos que acontecesse na Terra um cataclismo e toda a nossa civilização fosse destruída, com todas as nossas conquistas científicas e tecnológicas. 

E digamos que fosse possível preservar, para a humanidade futura, apenas uma frase, uma frase que contivesse o máximo de informação sobre nossa ciência, sobre o máximo a que conseguimos chegar na decifração dos segredos do Universo. Que frase seria essa?

Feynman propôs esta resposta: 

“Todas as coisas são feitas de átomos, pequenas partículas que giram em movimento perpétuo, atraindo-se umas às outras quando estão próximas, mas repelindo-se quando são ‘apertadas’ umas de encontro às outras”.

Para Feynman, bastaria um pouco de imaginação filosófica e de experiências práticas para, partindo desse ponto, recomeçar a civilização. É algo que a humanidade procurava tateando, desde os filósofos pré-socráticos, e acabou estabelecendo como hipótese central de trabalho, milhares de anos depois, no decisivo século 20. 

A definição “partículas” é questionável, mas é um bom ponto de partida para discutir a natureza da matéria. O fato de que se atraem e se repelem em diferentes condições deixa implícita a cadeia de reações cuja existência comprovamos, e cuja natureza até hoje tentamos explicar (“força forte”, “força fraca”, “gravidade”, “eletromagnetismo”, etc.). 

Como faria a civilização futura para reconstituir todo o nosso edifício científico a partir dessa frase? Bem, isso aí daria um bom romance de FC na linha de Um Cântico para Leibowitz

A frase de Feynman mata a charada? De jeito nenhum. Um biólogo, um químico, um antropólogo, um economista etc. proporiam frases-síntese muito diferentes. 

O que desafios desse tipo têm de bom é que nos forçam a voltar para o básico-das-coisas, como quando uma criança nos faz totalmente a sério uma pergunta fatal: Por quê que chove? O sol é feito do quê?  Por que umas coisas caem e outras (uma pena, p. ex.) não? Pra onde a gente vai quando dorme? O que tem embaixo do chão? De que é que eu sou feito?