terça-feira, 26 de janeiro de 2016

4034) Os namorados de Mamãe (27.1.2016)



Quando é domingo de sol eu sempre tenho uma certa esperança de que ao se abrir a porta do quarto dela seja Alvinho, que sempre acorda de bom humor e geralmente me chama para jogar bola na praia durante uma hora, meia hora, enquanto Mamãe se levanta e faz todo aquele ritual dela, de tomar um café vagaroso sem registrar a presença de ninguém, folheando o jornal, lendo como se aquilo lhe custasse o maior esforço, dizendo: “Hã. Hum.” Alvinho é gente fina, mas até agora só veio nos sábados à noite.

Quando não é ele, é Dr. Rui. Esse é mais idoso, mais devagarzão, sempre levanta com Mamãe, preparam tudo juntos, trocando instruções, receitas, o tempo da torrada, o modo de tampar a frigideira para deixar o ovo bem estrelado, coisa e tal. Parecem um casal casado. Ele sempre me cumprimenta, lembra do meu nome, pergunta como estou indo nos estudos, eu sempre digo a mesma coisa, nem lembro o que.

Nos últimos meses tem aparecido um tal de Antonino, que eu não gosto muito. Eu estudo à tarde e nem vejo mamãe sair pro trabalho, mas às vezes levanto e ele está na sala, todo instalado, ouvindo música, mexendo nas revistas, comendo, bebendo, como se estivesse na casa dele. E quando conversamos os três, em geral durante o almoço, ele fica dizendo umas coisas sem a menor graça e batendo com o cotovelo em mim, como se dissesse: “Bora, rapaz, dá uma risada, afinal nós somos ou não somos dois malandrões? Ra ra ra.”

Pra ser desse jeito eu prefiro que seja como Seu Elias, que é tímido que dá pena, fica meio longe de mim com uma expressão de culpa, nunca me deu um bom dia, nunca me olhou nos olhos, e os únicos contatos que a gente mantém são quando estamos na mesa e um estende a mão e o outro se apressa e coloca ao alcance aquilo que está sendo procurado: o açúcar, a bolacha, o leite; e esses pequenos gestos quase secretos acabam sendo uma espécie de fumar-o-cachimbo-da-paz.

Mamãe se faz de doida mas presta atenção em tudo. 

Teve o caso de Dorival, que passou semanas vindo e deixou para sempre de vir depois que Mamãe o flagrou tentando me fazer botar um cigarro na boca. 

Teve o problema com aquele malucão que cismou que eu tinha tirado um dinheiro da carteira dele, Mamãe teve que fazer um verdadeiro histórico do que eles tinham gasto durante a noite, táxi, conta num bar, no outro, cigarro, dogão na calçada, táxi de novo, ele acabou me pedindo desculpas, mas nunca mais apareceu. 

Ou aquele louro de óculos, nem lembro o nome, que falou uma vez: “E esse moleque, precisa ficar aqui, vigiando a gente? Vai lá pra fora, vai, seu merdinha.”  Mamãe soltou da boca o canudinho do refrigerante e disse: “Pra fora vai você.  Filho da puta.”