segunda-feira, 19 de outubro de 2015

3949) Poeminha curto (20.10.2015)




(Leminski, por Marcos Guilherme)


Já vi esse tipo de poema descrito como “poeminha leminskiano”. O curitibano Paulo Leminski não o inventou, mas é um dos seus melhores executantes.  

Ninguém inventa essas coisas, essas formas simples. Esse formato difuso brotou junto com os poetas da minha geração, os que começaram a divulgar seus poemas nos anos 1970 e nos 80 já estavam em livro. 

Eu fiz um monte deles, todo mundo fez um monte, e com frequência vemos belas coisas sendo ditas.

Leminski é candidato à faixa de melhor fazedor, com preciosidades como: 

pariso 
novayorquizo 
moscoviteio 
sem sair do bar 

só não levanto e vou embora 
porque tem países 
que eu nem chego a madagascar.

Ou essa fotografia zen: 

o barro 
toma a forma 
que você quiser 

você nem sabe 
estar fazendo apenas 
o que o barro quer.  


Esses movimentos de ida e volta do poema se mantêm mesmo quando cada bloco fica menor em tamanho: 

um pouco de mao 
em cada poema que ensina 

quanto menor 
mais do tamanho da china.


Isto é o poema curto em dois blocos.  Tem um desenlace rítmico diferente da sextilha, diferente do haicai. Estruturalmente, corresponde mais ou menos a duas quadrinhas (ou tercetos, ou dísticos, misturadamente) superpostas, resultando num poema de 6 a 8 linhas no total, com uma cesura ao meio. 

O verso do meio e o último (o 4o. e o 8., digamos) rimam entre si. Este efeito é mais importante do que o numero total de versos, e se eles rimam internamente entre si ou não. É como se o poema mostrasse a cara, depois a coroa, e tudo rimasse. Um vapt e um vupt. Um zás e um trás.

O primeiro bloco pode ter de uma a quatro linhas, raramente mais, linhas que exibem rimas ou não, e ele se conclui com uma linha onde é proposta a rima que deve se repetir no final. 

A leitura desse primeiro bloco deixa uma expectativa rítmica e sonora a ser preenchida pelo segundo. Quando ele o faz, fecha o poema com um senso de resolução melódica e simetria estrutural. 

O perigo de tal verso é apenas, como o de toda forma simples, o de ser muito acessível ao versejador preguiçoso ou sem muito o que dizer.


Ainda Leminski, este com um alô de chapéu a Yeats: 

eu tão isósceles 
você ângulo 
hipóteses 
sobre o meu tesão 

teses sínteses 
antíteses 
vê bem onde pises 
pode ser meu coração.  

Este, sobre a bolandeira do fazer versos: 

moinho de versos 
movido a vento 
em noites de boemia 

vai vir o dia 
quando tudo que eu diga 
seja poesia. 

E esta declaração de guerra em forma de cambalhota: 

o pauloleminski 
é um cachorro louco 
que deve ser morto 
a pau a pedra 
a fogo a pique 

senão é bem capaz 
o filhodaputa 
de fazer chover 
em nosso piquenique.