sexta-feira, 27 de março de 2015

3773) "O Anjo Exterminador" (28.3.2015)



Estou coordenando, para a Escola de Cinema Darcy Ribeiro (Rio de Janeiro) uma Mostra do Cinema Fantástico, com filmes todos os sábados às 14 horas, entrada franca. A escola fica na esquina da Rua 1º. de Março com Rua da Alfândega, pertinho do CCBB. (Após a sessão deste sábado, haverá debate comigo e o prof. Sérgio Almeida.)

Para hoje está programado O Anjo Exterminador (“El Ángel Exterminador”, 1963) de Luis Buñuel, realizado no México logo depois que Buñuel, tendo passado um período de relativa obscuridade, ganhou prêmios internacionais, provocou escândalo com Viridiana (1961) e voltou a chamar a atenção da crítica. Em O Anjo..., o milionário Nobile traz para sua mansão um grupo de amigos para um jantar, após a apresentação de uma ópera. Acabado o jantar, eles descobrem que não conseguem sair do salão principal da casa, embora as portas estejam abertas. Uma espécie de bloqueio mental os impede de cruzá-las, e do mesmo modo as pessoas de fora não conseguem entrar na casa. Há uma barreira invisível, mas não é física, e sim mental.

Buñuel mostra a lenta bestialização daquelas pessoas ricas e sofisticadas (seriam chamadas hoje de “coxinhas”) quando começam a sentir falta de comida, água, sanitários. Choram, desesperam-se, trocam socos e acusações, vão aos poucos regredindo a um estágio animalesco. Trancafiados num salão aberto, em breve não se distinguem mais de um grupo de moradores de rua, sujos e famintos. Alguns começam a morrer, e os cadáveres são escondidos em armários.

Assim como o personagem de Feitiço do Tempo de Harold Ramis fica preso no trecho de tempo, os personagens de Buñuel ficam presos num espaço, sem nenhuma explicação. O interesse do diretor é mostrar o processo de deterioração física e moral de todos. Buñuel (tratei disto em meu livro O Anjo Exterminador, Ed. Rocco, 2002) traz para seu cinema influências do movimento surrealista francês dos anos 1920, do qual fez parte; da literatura de folhetim européia; do romance gótico de terror dos séculos 18 e 19.  Seu individualismo feroz o fez investir contra a Igreja, o Estado, a Burguesia, contra tudo que, a seu ver, limitava as liberdades do indivíduo.

É um filme fantástico que não sugere nenhuma explicação racional, embora os personagens comentem sem parar o que aconteceu, proponham hipóteses, tentem descobrir uma maneira de sair dali. Buñuel desdenhava explicações: com o Surrealismo ele aprendeu a importância do impacto direto das imagens absurdas e das situações insólitas, como elemento capaz de desestruturar nosso raciocínio, descarrilar o trajeto seguro das explicações preconcebidas, da lógica, do racionalismo.



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