segunda-feira, 27 de outubro de 2014

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(ilustração: Dariusz Klimczak)

Acabou a campanha.  Ontem, os brasileiros escolheram funcionários públicos de quem deverão cobrar serviço durante os próximos quatro anos.  Pra quem tem o poder, quatro anos passam num instante, vapt-vupt, não dá tempo nem de gelar a cerveja.  Para a oposição, quatro anos são uma eternidade. Uma Kalpa multiplicada por um Eon, um exílio sem fim na masmorra da ilha onde ficou preso o Conde de Monte Cristo.  Felizmente, ao contrário de Edmund Dantès, quem desaba na oposição tem direito, no seu calabouço, a internet bandalarga e conexão com tudo em tempo real.  Calada ela não vai ficar.

Poderiam todos ficar mais serenos, depois que passar a adrenalina das quatro linhas. (Do futebol ou do UFC?  Digamos futebol, é mais diplomático.) Todo mundo acha bonito quando, no fim de um clássico disputadíssimo, entre dois times de ponta e antagonistas históricos, num jogo de muitos gols e viradas no placar, cheio de cartões e “lances ríspidos”, então, conquistado o título, os que estavam trocando carrinhos e cotoveladas se abraçam, trocam de camisa, comentam alguma coisa, dão uma risada.  O jogo acabou (dizemos nós, ainda meio surpreendidos com essa cultura tão moderna); eles “são profissionais, são colegas de trabalho”.  E achamos bonita a transição da fúria guerreira para o sorrisão diplomático.

Quando é com os políticos... Por que todo mundo se escandaliza quando os vê trocando de time, abraçando os ex-antagonistas, trocando por elogios os antigos vitupérios? Ora, por que não o fariam? São profissionais também.  São colegas de trabalho.  Surgem na vida com um personagem, ou com um projeto de.  São aceitos, burilados em público, jogados à arena das gramas e à das urnas, e os que vão sobrevivendo têm chance de um dia serem convocados para alguma coisa. 

Num ano como 2014 não é possível não matutar um pouco como são duas profissões incompreendidas no Brasil: político e jogador de futebol!  Veja com quantas más avaliações se faz um Irremediável. Nossos principais super-heróis, e começam a pedir recall. Cada um deles tem seu quinhão de hubris e de comemorações na avenida, seu quinhão de cooptações ou de apequenamentos, seu pênalti chutado às nuvens, seus sonhos em reboot.  São profissionais. Não sei se pensam em salvar o mundo, nem se acreditam quando são chamados de deuses com asas nos pés.  Os dois são injustiçados de um lado, hiperinflacionados do outro, mas isto é Brasil, é nessa dinâmica que toca a orquestra. Se é tudo um jogo, que se jogue o jogo; e não pode ficar um a um.  Que se jogue limpo, porque há leis de sobra.  Projetos para melhorar nem se fala.  Ídolos, não maltratem a bola não, que a bola pune. Vida que segue.