quinta-feira, 17 de julho de 2014

3553) A entropia do futebol (17.7.2014)



Há um livro, se não me engano de Neil Gaiman, em que o mundo está passando por um aumento da entropia.  Entropia é a medida da desorganização do Universo, em que há uma dissipação da energia e todas as coisas vão ficando mais caóticas e indiferenciadas. Quando a gente deixa uma xícara de café em cima da mesa, ela se degrada, esfria sozinha, perde energia. No mundo descrito por Gaiman, as fitas cassete com música gravada (clássica, popular, etc.) se guardadas por mais de duas semanas sem ninguém mexer nelas, se degradam – transformam-se todas em The Best of Queen.

O que me lembra um clássico da FC: Ubik de Philip K. Dick.  No universo em que vive o protagonista, acontece algo semelhante. O universo está involuindo, está sofrendo um aumento de entropia que faz as coisas se tornarem progressivamente mais antigas, mais atrasadas. A história se passa no futuro mas à medida que a entropia aumenta o personagem anda na rua e as pessoas começam a aparecer com roupas dos anos 1940, os carros viram carros daquela época, e assim por diante. Quando ele toma o remédio chamado “Ubik”, uma espécie de tônico miraculoso, aí tudo bem: carros, roupa, arquitetura, anúncios nas ruas, tudo volta a pertencer à época em que a história acontece.

Posso estar sendo pessimista, mas acho que estamos passando por um período ubikiano no futebol.  Esta Copa mostrou grandes times campeões do mundo jogando um futebol muitíssimo abaixo do que praticavam pouco tempo atrás, inclusive o Brasil.  Há uma diferença ubikiana entre nossa Seleção da Copa das Confederações e a da Copa do Mundo. O que dizer da fortíssima Espanha, campeã mundial em 2010, que chegou no Brasil e virou saco de pancadas, como se fosse uma espécie de Íbis?  Os grandes craques como Cristiano Ronaldo, Messi, Iniesta, etc., todos estavam atuando na Copa como versões bizarras de si mesmos. E não me venham falar dos poucos times ou poucos craques que jogaram bem. São a exceção que confirma a regra. (Se eu fosse rico destinaria alguns milhões de dólares ao sujeito que inventou essa frase, um 171 filosófico que permite à gente afirmar qualquer coisa e escapar impune.)

Nosso futebol, em especial, está passando por uma degradação espontânea, uma entressafra sem fim, uma fase Ubik, e urge descobrir o tônico fantástico que nos trará de volta ao jogo bonito que poderíamos estar praticando em 2014. Esta regressão entrópica, da qual nem a Seleção Brasileira escapou, está fazendo com que mesmo algumas das melhores equipes do mundo pisem no gramado para praticar um futebol bumba-meu-boi digno dos melhores (piores) momentos de algumas peladas da Concacaf ou da Oceania.