quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

3432) Entrevista (26.2.2014)



PERGUNTA – Sr. Braulio, o momento atual da literatura envolve impasses que, ao que parece, não estão sendo resolvidos de maneira satisfatória nem pela crítica, que, presa a critérios estabelecidos, demonstra pouca maleabilidade para acompanhar o fôlego criativo dos novos autores, nem pelos próprios autores, que apesar da garra e da adrenalina características das novas gerações tendem a perder de vista o específico literário e a dissipar suas energias em atividades extra-página, por assim dizer, tais como incontáveis sessões de autógrafos, palestras, aparições em talk-show da TV, participações em festas literárias e bienais do livro, realização de oficinas, manutenção de websaites, divulgação nas redes sociais, e todo um conjunto de práticas menos voltadas para a criação literária do que para a divulgação dos resultados dessa mesma criação. Para alguns, trata-se de uma tática de sobrevivência em que a literatura, sempre encurralada nas fatias mais estreitas da divisão do mercado, procura adotar para si uma postura mais agressiva através da ênfase em táticas da publicidade e da propaganda, o que traz a mente a filosofia de trabalho de alguns filmes de Hollywood, que destinam 100 milhões de dólares para a feitura do filme e 150 milhões para a sua divulgação.  Ora, isso acaba criando um aparente impasse entre duas funções paralelas com que qualquer escritor em qualquer época sempre se defrontou, a necessidade de produzir livros e a de divulgá-los, sabendo-se que qualquer uma delas estará sempre subtraindo da outra tempo, esforço e energia. O que se coloca diante dos autores, no entanto, parece ser algo mais complexo do que a mera organização do tempo de trabalho, porque salta aos olhos o fato de que escritores mais afeitos às tarefas propagandísticas do que ao fazer literário parecem estar colhendo frutos mais substanciais do que aqueles que não se sentem muito à vontade em aparições públicas diante de platéias e de câmeras, seja por timidez, seja pela fadiga resultante dos incessantes compromissos, viagens, idas e vindas, etc., seja até por uma compreensível irritação diante da expectativa, que parece também ser típica dos leitores de hoje, de que um escritor seja também uma espécie de showman ou de garoto-propaganda de si mesmo.  O senhor acha que, neste contexto, caberia aos autores em geral uma atenção maior ao desenvolvimento da própria escrita, a fim de que a literatura não venha a se tornar, como parece estar ocorrendo em outras atividades como o próprio jornalismo, um território dominado pelos mais fluentes, os mais extrovertidos, os mais semelhantes aos atores de cinema e de televisão?  RESPOSTA – Sim.