domingo, 8 de dezembro de 2013

3364) Gronk (8.12.2013)





(by Raziel)
 
No meio de um sono inquieto, Váldson se vira, e naquele breve instante percebe um peso ao seu lado, e vê que Gronk subiu na cama mais uma vez. Não acredito, pensa ele, só me faltava essa. Suspira com resignação e estendendo o braço bate com os nós dos dedos na carapaça do outro. “Gronk, levanta daí, vai, acorda,”, diz ele. Gronk resmunga como quem finge estar dormindo, mas o resmungo foi pronto demais, está na cara que estava acordadíssimo. “Vai, vai, já falei que não é pra vir pra minha cama”, insiste Váldson. “É só um pouquinho,” murmura Gronk, fingindo voz de sono, “lá fora está frio”. “Frio coisa nenhuma,” rebate Váldson, “vai pro seu canto, isto aqui não é seu lugar.” “Deixa eu ficar, só hoje,” o outro pede. “Não, não. Desce senão eu vou buscar o spray.” “Calma, calma,” protesta Gronk, mexendo-se, transferindo-se pouco a pouco para o chão, “sem violência, onde já se viu”. Arrasta-se para fora do quarto. Váldson está cansado demais para trocar o lençol, limita-se a tirar a camiseta e bater no lençol, jogando para o chão as escamas, a areia.
Deita-se, põe um dos travesseiros sobre os olhos, mas quando está quase adormecendo começa a ouvir um ruído metálico, ritmado, irritante. Tenta se concentrar no sono mas o ruído insiste, fica mais forte. Ele pula da cama, desesperado. Gronk está deitado no chão do corredor, e com as garras dos pés está descascando a porta do armariozinho. “Mas o que é isso agora?!” “Eu falei que estou com frio.” “Com frio num calor desse? E precisa estragar a porta do armário?!” “Opa, nem vi. Minhas pernas estão tremendo de frio.” “Já pra área de serviço! Agora! Senão, já sabe!” “Você não passa de um burguês, um ditadorzinho que quer demonstrar poder em cima dum animal de estimação.” “Você nem é animal nem de estimação, você é um castigo que eu recebi. Não sei onde eu estava com a cabeça quando aceitei essa coisa na minha casa. Cai fora, vai!” 
 
Gronk volta a se arrastar, a cauda coriácea abanando para um lado e para outro,  batendo nos móveis enquanto ele cruza a cozinha e vai para a área de serviço. Váldson vai lá, olha: latas de conserva dilaceradas, pães roídos pela metade, livros jogados de qualquer jeito, se amassando. Gronk deixa o enorme corpo anelídeo tombar no colchonete e com as pinças agarra um volume de Douglas Hofstadter. “Se for pra lá de novo, já sabe, spray de álcool!” avisa Váldson, afastando-se. O outro resmunga: “Espero que seu filho esteja sendo bem tratado no meu planeta, melhor do que eu aqui.” “Dorme, e não enche o saco.” Váldson vai se deitar.
 
Faltam duas semanas para acabar o período do intercâmbio escolar, e ele não bota muita fé no futuro pacífico da Galáxia.