terça-feira, 15 de outubro de 2013

3317) Biografia ou fofoca (15.10.2013)



Fiquei sem saber se me metia na polêmica sobre biografias não-autorizadas. De um lado, querendo manter a lei que as proíbe, estão compositores como Chico Buarque, Roberto Carlos, Caetano, Gil e Djavan. Do outro, defendendo o direito de alguém escrever uma biografia sem pedir ao biografado, estão Ruy Castro, Fernando Morais, Lira Neto e outros autores de biografias famosas. Sinto-me próximo aos dois grupos, mas é mais provável eu escrever um dia a biografia de alguém do que alguém escrever a minha.

Sou contra a proibição prévia de biografias não-autorizadas. Minha regra é: deixa publicar, e depois avalia. Temos uma tradição de excelentes biógrafos, e o gênero é levado a sério em nosso país. Biografias mal-intencionadas ou incompetentes dificilmente emplacam. E trabalhos sérios como os dos que citei acima e outros, sempre dão um bom retorno de público e crítica. Sou contra censura prévia. Se uma biografia minha me ofender, ou disser mentiras ao meu respeito, chamarei meus advogados e cairei com-água-e-lenha em cima do pirangueiro, que vai arrenegar o dia em que nasceu. (Cuidado com os caras bonzinhos feito eu. Somos vingativos.)

Tenho, contudo, um esboço de teoria para explicar o inexplicável, para entender por que cantores e compositores tão inteligentes se unem para bloquear o trabalho dos biógrafos. É que nossa música popular, ou melhor nosso “show-business” (a cada década que passa temos mais “show business” e menos música popular) convive, de maneira um tanto promíscua, não com biógrafos acadêmicos ou sérios, mas com a indústria de fofocas, difamações e calúnias que se espalha por canais de TV, revistinhas de fãs e de frivolidades em torno da mídia, colunas de mexericos mal-intencionados, blogs de fofocas plantadas por vingança ou despeito...

É da maledicência, doença endêmica do “show-business”, que eles têm medo, não dos biógrafos da academia ou da imprensa séria. Acham que se a lei for revogada logo aparecerão Fulaninho, Sicraninha ou Beltraninho prontos para destilar venenos, exageros, insinuações dúbias, e tudo o mais que infelizmente é moeda corrente nesse camelódromo da informação que ajuda a sustentar gravadoras e tevês. A mentalidade de estrelismo do “show business” faz da música e da televisão uma feira de vaidades, um bazar de invejas, um forno de ressentimentos. “Biografia”, no dicionário que vigora ali, é a chance de ajustar contas em nome de confrontos passados ou de antipatias gratuitas. O problema é que, na ânsia de se livrar dos picaretas, nossos artistas estão querendo barrar os estudiosos sérios. E tanto eles quanto os biógrafos sairão deste equívoco como perdedores.