quinta-feira, 22 de agosto de 2013

3271) TV Vigilância (22.8.2013)



(Videodrome, de David Cronenberg)

As discussões a respeito do uso da TV daqui pra frente têm que considerar que a TV está deixando de ser apenas espetáculo. Continuamos vivendo na tal “Sociedade do Espetáculo”, mas quando tudo vira espetáculo, o poder magnético do espetáculo se dilui, se redistribui ao longo de toda a cadeia. A TV Espetáculo tenta se manter como pode, mas cresce uma coisa nova: a TV Vigilância, produzida pelos milhares de câmeras espalhadas pelas autoridades nas ruas, praças, prédios, etc.  Agora surgiu sua contrapartida: uma TV Vigilância da população. Com os novos meios de transmissão individual, cada pessoa pode se transformar numa TV ao vivo.

As transmissões recentes da Mídia Ninja varam o dia, a noite, a madrugada, transmitindo ao vivo manifestações ou reuniões, mas sofrem uma crítica constante: “Quem diabo tem tempo para acompanhar uma manifestação em tempo real? Quem pode ficar a noite toda em casa sentado, assistindo uma passeata?” Amigos já me disseram: “Acho simpático, mas prefiro o compacto de 3 minutos sobre a passeata, feito pelas TVs convencionais”.

Eu vejo essas manifestações. Como? Abro uma aba no TwitCasting, solto ali a transmissão da Mídia Ninja, abaixo o som, troco de tela e fico trabalhando, ou então maximizo a imagem e fico lendo numa poltrona próxima. Quando a voz do narrador sobe de tom, olho para a tela. (É assim que vejo futebol, aliás. Não fico grudado no futebol os 90 minutos. Eu deixo ligado – e leio, escrevo, trabalho, toco violão, e só presto atenção “quando o bicho pega”.) Não é espetáculo, é uma parte do ambiente, algo que está sempre ali, como o rádio que acalenta as fantasias das donas-de-casa que cozinham, ou como a muzak que atenua a promiscuidade demográfica dos elevadores.

A TV Vigilância, aliás, não é nada de novo. Darei um exemplo: a TV Câmara e TV Senado. Quem assiste aquelas tediosas transmissões dos bate-bocas e dos bate-papos dos nossos bravos congressistas? Resposta: muito pouca gente, mas é bom saber que votações de leis e defesas de projetos podem ser acompanhados por alguns milhares de indivíduos interessados no que vai ser discutido naquela tarde ou noite. Aliás, a transmissão de algumas CPIs tem dado índices de audiência sensacionais para uma TV “chapa branca”. Esse tipo de vigilância não é para dar Ibope nem para ser assistido no dia-a-dia – mas precisa estar presente no dia-a-dia, para que grupos diferentes de pessoas assistam, de acordo com o interesse de cada um. É o contrário da TV espetáculo, em que “o Brasil para pra assistir o capítulo da novela”. E volto ao meu bordão: se o Governo vigia o Povo, o Povo deve usar a mesma tecnologia para vigiar o Governo.