terça-feira, 4 de outubro de 2011

2678) Rock in Rio (4.10.2011)



Esperar espírito roqueiro num festival concebido e realizado por publicitários, financistas e fazedores de dinheiro é como ser um peixe, ver uma minhoca pendurada na ponta de uma linha, e imaginar que aquilo é um almoço gratuito. O Rock in Rio é uma briga de foice entre gravadoras (sim, ainda existem), empresários e patrocinadores para ver quem consegue colocar seus garotos-propaganda na frente de cem mil pessoas. Ficar discutindo que Fulano não deveria estar lá porque usa sequências harmônicas que não são típicas do rock, ou que Sicrano não faz música contestadora, equivale a achar que numa eleição só deveriam concorrer representantes autênticos do povo. Aquela galera está no Rock in Rio pelos mesmos mecanismos por que aquela outra galera está no Congresso Nacional.

Vi o Multishow, em parte para rever artistas que fazem parte da minha trilha sonora autobiográfica (Stevie Wonder, Elton John). Perdi outros que acho competentes (Metallica, Red Hot Chili Peppers). Vi um pouco do Slip Knot (estava trabalhando), que ainda acho uma incógnita; vi o Motorhead, que tem um guitarrista veloz e um vocalista com visual Dennis Hopper e voz mais rouca do que o cantador João da Silveira. Algumas surpresas interessantes (Josh Stone, Janelle Monáe) e coisas indescritíveis como KeSha, que parece uma integrante perdida do Spinal Tap.

Recorro ao depoimento de um dos meus gurus no assunto rock, o insuspeito Anderson Foca, que postou no Facebook: “A turma leva a sério demais o nome rock, quando na verdade o rolê é coxinha desde o início: Ivan Lins, Elba Ramalho, Al Jarreau e afins. O forte do rolê não é música, é entretenimento e diversão para quem paga o ingresso. Todos os festivais de grande porte são assim... Quem gosta de música vai a pubs, festivais indies, tours de bandas e afins. Quem vai a festival hype, vai pela vivência... Estamos no Brasil e os grandes festivais também são aqueles que trazem grandes artistas, isso termina resvalando em fãs de música que querem ver aquele show esperado e não têm outra oportunidade. Aí, tem que aguentar o rojão e ir mesmo ao grandes festivais. Resumo da ópera: tá valendo, vai quem quer e depois não reclame que tava apertado, que não tem como voltar, que foi roubado...”

O x do problema é a necessidade de botar o nome rock, que tem, para a galera de 20 anos, a credibilidade e o apelo que o nome jazz, digamos, tem para a de 40. Quem daria aquela pequena fortuna para ir a um festival chamado “Chiclete-Music in Rio” ou “Enganation in Rio”? Tem que chamar de Rock. E o bom é que, criada a fórmula, alguma coisa de rock vai ter que entrar na programação, pra poder vender o resto.