sexta-feira, 8 de abril de 2011

2525) Os games e as artes (8.4.2011)



Roger Ebert é um crítico de cinema que leio com frequência e admiro, porque mesmo quando sua opinião sobre os filmes não coincide com a minha ele sempre tem coisas inteligentes a dizer. Para mim, isto justifica uma leitura muito mais do que a mera concordância de pontos de vista. De uns tempos para cá ele se envolveu numa polêmica porque pisou nos calos de uma das comunidades mais xiitas e mais combativas que tem por aí, a dos videogamers. Ebert afirmou, num contexto que não tive tempo de verificar, que videogames nunca poderiam produzir grandes obras de Arte. Caiu-lhe na cabeça um terabyte de emails discordantes, desde os mais grosseiros e agressivos até os bem-humorados que o questionavam em seus próprios termos. Arrependendo-se de ter mexido nessa casa de marimbondos, Ebert escreveu:

“Estou preparado para crer que videogames podem ser elegantes, sutis, sofisticados, desafiadores, visualmente maravilhosos. Mas eu creio que a natureza dessa mídia a impede de passar do estado de artesanato para arte. Que eu saiba, ninguém dessa área ou de fora dela já foi capaz de citar um game merecedor de comparação com os grandes dramaturgos, poetas, cineastas, romancistas e compositores. Que um videogame possa aspirar a ter importância artística, eu aceito. Mas para a maioria dos jogadores eles representam uma perda de horas valiosas de que dispomos para nos tornar mais cultos, mais civilizados, e ter mais empatia com nossos semelhantes”.

Os argumentos de Ebert (que colhi neste ótimo artigo-resposta de Brian Moriarty, em: http://www.gamesetwatch.com/2011/03/opinion_brian_moriartys_apolog.php) são familiares. Quando uma nova e incipiente forma de expressão aparece, a gente sempre duvida de que dali possa brotar algo igual às grandes obras de arte anteriores. E tem razão. Quando apareceu o cinema, as pessoas que gostavam de teatro diziam que o cinema jamais produziria um Ésquilo ou um Shakespeare. Tinham razão, porque o que o cinema produziu de bom (Fellini, Orson Welles, Buñuel – ou Spielberg, Kubrick, Scorsese – ou Ozu, Rohmer, Tarkovsky – coloque os seus nomes preferidos!) não tem nada a ver com o que foi feito pelos grandes nomes do teatro.

Eu digo às vezes que ainda não surgiu “o Griffith, ou o Chaplin, ou o Fritz Lang dos videogames”. Mas sei que quando surgir não será alguém que vai fazer nos games algo parecido com a obra desses caras. Ele vai dar aos games uma nova possibilidade de expressão profunda da mente humana e do sentimento coletivo humano, uma expressão que o cinema, o teatro e a literatura não podem dar, porque ela será específica do videogame. O que vai ser? Não sei, nem posso saber. Será uma arte nova, porque as novas artes surgem da conquista de novas técnicas de produção/reprodução de representações sensíveis (imagens, sons, palavras, etc.). Nem toda técnica resulta numa arte, mas toda arte é consequência de uma técnica que alguém soube usar com grandeza criativa.