sexta-feira, 13 de agosto de 2010

2319) “A Origem” (13.8.2010)



Este filme de Christopher Nolan está sendo chamado de “Matrix do Século 21” (não esqueçamos que o Matrix que abriu a trilogia é de 1999), e com razão. Bastante parecido, e diferentíssimo. Nolan é famoso hoje pelos seus dois filmes de Batman (Batman begins, 2005, 150 milhões de dólares; Batman, o Cavaleiro das Trevas, 2008, 185 milhões) mas pra mim ele é acima de tudo o cara que fez dois filmes personalíssimos: Amnésia (2000, 5 milhões), aquela história de crime contada de trás para diante, e O Grande Truque (2006, 40 milhões), a peleja entre dois mágicos na Inglaterra vitoriana, adaptando um romance de Christopher Priest. A Origem (“Inception”) é um filme de 160 milhões de dólares e de certo modo tenta fazer a ponte entre os filmes de ação e os filmes-cabeça do diretor. Estou citando esses orçamentos porque são números essenciais para definir um gênero. Até que ponto é possível (nos EUA) fazer um filme de ação bem sucedido com 5 milhões de dólares? Até que ponto é possível fazer um filme-cabeça bem sucedido com 160 milhões?

É nessa corda-bamba que se equilibra Nolan, um diretor que tem ambições mentais, quer contar histórias complexas, quer tocar em questões metafísicas através de enredos de ficção científica, e de fato se beneficiou em parte do sucesso de filmes como Matrix para poder alavancar (este verbo tão hollywoodiano) projetos como Origem. Como o filme entrou recentemente em cartaz, não discutirei em detalhe o roteiro, que tem as previsíveis surpresas e reviravoltas do gênero. Mas comentarei um aspecto dessa fusão de dois gêneros (ação e cabeça).

Não se trata de uma fusão, mas de uma colagem. Nolan bolou um enredo sobre pessoas capazes de penetrar nos sonhos das outras e viver lá dentro como se fosse uma realidade virtual a mais. Isto daria um ótimo thriller psicológico – vejam que não estou reivindicando nada do tipo Alain Resnais ou David Lynch. Pra mim, thriller psicológico tá de bom tamanho, é uma fórmula que pode resultar num ótimo filme. Como chegar a essa fórmula? Muito simples: tirando as cenas de ação, e o filme não perderia nada. Não perderia nada sem: 1) a perseguição a DiCaprio através da feira livre de um país oriental; 2) as duas perseguições à van onde os “ladrões de sonhos” fogem pela cidade, van que é atingida por cerca de 500 balas de alto calibre e só um cara é ferido; 3) o cerco e assalto à fortaleza na neve, que um crítico ironicamente chamou de “o momento Estação Polar Zebra do filme”. Para mostrar que não tenho nada contra cenas de ação, eu deixaria toda a sequência inicial, e depois toda a sequência em gravidade zero no hotel de luxo (tem que ver o filme para entender do que se trata). Os intermináveis, explosivos e ruidosos trechos de ação estão aí para fazer com que 2/3 da platéia assistam o restante do filme. Origem é como aqueles filmes-cabeça de Robbe-Grillet, cheios de cenas de sexo, sem as quais não seriam financiados, exibidos ou vistos.