segunda-feira, 5 de julho de 2010

2230) Os presidentes e os flanelinhas (1.5.2010)



(tira de Laerte)

E lá vamos nós para outra eleição presidencial. O país inteiro se mobiliza, os partidos se organizam para gastar milhões de reais, e nós teremos o dúbio privilégio de dizer se queremos ser governados por Dilma Rousseff ou por José Serra. Tudo bem, trata-se de uma ex-guerrilheira de esquerda e um ex-presidente da UNE; mas quando chegam ao ponto de disputar um posto como esse, ambos estão muito diferentes do que foram um dia, e muito parecidos um com o outro. Hoje, a única diferença entre Dilma e Serra é que o cabelo de Dilma cresceu de novo.

Perdi uma oportunidade histórica alguns anos atrás. Em outubro de 2007, a ministra da Casa Civil foi internada no Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, onde fez uma cirurgia de diverticulite. Ora – foi esta doença a razão alegada para a primeira internação e cirurgia de Tancredo Neves, na manhã do dia em que deveria tomar posse na Presidência da República, em 1985. Hoje a versão vigente é de que se tratava de um tumor benigno; mas como a doença alegada na época foi diverticulite, essa palavra, durante muitos anos, tornou-se uma senha capaz de gerar calafrios de paranóia na medula de qualquer brasileiro. Falar em diverticulite era lembrar todas as Teorias da Conspiração que herdamos da ditadura militar.

Deduzi naquela época que Lula ia indicar Dilma como candidata a sua sucessão, e que a cirurgia de diverticulite fora realizada preventivamente, para que não tivesse de ocorrer quando ela já estivesse ungida como candidata. Não escrevi a respeito porque tinha coisas mais importantes para me ocupar, e se o faço hoje é porque a campanha presidencial já se desenha no horizonte.

Por que damos tanta importância à Presidência da República? Num mundo como o de hoje, ainda mais num país mal-das-pernas como o nosso, é um cargo meramente decorativo. O Presidente da República administra o país, sim, mas o administra e governa em nome dos seus verdadeiros donos, que são as Eminências Pardas de sempre, os tubarões da economia, as megacorporações, os superbanqueiros. O Presidente cuida do varejo do país, como um mordomo ou uma governanta cuidam do varejo de uma mansão de 90 quartos enquanto os patrões estão fazendo turismo nas Ilhas Gregas.

Penso sempre nos presidentes (e aqui incluo Lula, Obama, Chávez, Sarkozy, Hu Jintao, qualquer um) quando estou chegando num restaurante e vejo um flanelinha pulando à frente do carro dos clientes. Como dá ordens! “Aqui! Bota aqui! Mais pra lá! Agora desfaz! Deixa solto!” Se um observador marciano olhasse a cena de longe, deduziria que ele dá as ordens e o motorista obedece. Naquele momento, o flanelinha também acredita nessa fantasia benigna, acredita nessa fala-de-condão que lhe dá o poder de ser obedecido por sujeitos de terno Armani ao volante de um BMW. Assim são os mandatários de qualquer país. Eles mandam, gesticulam, dão ordens veementes. Os caras ao volante estacionam onde querem... e vão à mesa.

Um comentário:

Anônimo disse...

e Gabeira, Aloisio Nunes, Franklin Martins, e tantos outros.. tb não são ex-guerrilheiros? Por que somente Dilma recebe essa carga de preconceito? Bem, pelo menos teu povo lá do NE não acha isso.