sexta-feira, 14 de maio de 2010

2043) “The End” (25.9.2009)



Um editor literário me disse uma vez que ao receber um conto lia a primeira e a última página. Se visse algo interessante nelas, lia o conto inteiro. A teoria dele é que uma boa história deve agarrar o leitor de forma inapelável ao longo da primeira página; se não, o leitor vai embora e não volta nunca mais. Quanto à última página, ela deve não apenas “fechar a história”, mas deixar uma lembrança viva, mexendo, azucrinando-no-bom-sentido a memória do leitor por semanas, meses a fio.

O Website Filmcritic fez um levantamento dos 50 finais de filmes mais marcantes da história (http://tinyurl.com/elvcv). O saite observa que “final do filme” não quer dizer os últimos 20 minutos, mas, literalmente, a última cena do filme. Eu sempre vejo com restrições o uso excessivo do que chamamos de “final surpresa”, porque é um recurso que (principalmente na literatura, e no conto) foi usado até ficar “dessa finura”. Mas um grande final é sempre bem-vindo, quando é marcante, impressionante, quando não é uma mera reviravolta, mas uma informação nova que nos faz ficar pensando.

Comentando A Bruxa de Blair, diz Christopher Null: “O filme não é especialmente aterrorizante, a não ser nos dois minutos finais, que elevam o nível de tensão de 10 a 100”. Eu concordo. O estilo pseudo-documentário cria uma impressão de realidade (mesmo a gente sabendo que é tudo mentira), e os últimos minutos nos projetam no terror puro. Vi o filme na TV, numa tarde ensolarada, com gente em casa, e tremi como se estivesse a sós num iglu, em plena noite polar.

No outro lado do espectro de emoções, o final de Oito e Meio de Fellini (os personagens, vestidos de branco, dançando ciranda em torno da estrutura inacabada do cenário do filme) é talvez o final mais “pra cima” e menos piegas do cinema. Diz Chris Cabin: “Algum final de filme, ou mesmo algum filme, já conseguiu sintetizar melhor a compreensão da vida como esta grande e absurda piada que ela é?”

Finais-revelação são aqueles onde tudo que vimos antes precisa ser revisto, repensado, reinterpretado. É aquilo que se chama de “conceptual breakthrough”, ruptura conceitual, quando percebemos que estávamos avaliando tudo por um paradigma equivocado. Há muitos grandes exemplos; o saite lembra dois. No filme policial Os Suspeitos, Kevin Spacey monologa e improvisa diante do cético policial Chazz Palminteri, numa das maiores demonstrações da arte do repente na história do cinema, cujo sentido só é esclarecido no último minuto. Na FC, temos O Planeta dos Macacos com a descoberta (acho que a essa altura do campeonato posso dizer) da Estátua da Liberdade enterrada até a cintura na areia da praia, mostrando que o tal planeta é na realidade a Terra num futuro remoto. Virou uma imagem icônica, definidora, do “sense of wonder” que caracteriza a FC.

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