quarta-feira, 5 de maio de 2010

1999) O cinema de arte e a FC (5.8.2009)




(Alphaville, de Godard)

Na última cena de 8 ½ de Fellini (1963) os personagens dançam uma ciranda em torno de uma plataforma de lançamento de um foguete espacial. 

Para mim, a plataforma tem um simbolismo: o temor reverencial que os intelectuais (incluídos aqui os diretores de filmes de Arte) têm para com a ficção científica. Olham para ela como Napoleão olhava para os hieróglifos da Pedra de Rosetta: algo que ele sabe que pode conquistar, comprar, vender, destruir, mas não consegue entender.

Enquanto isto, outros diretores europeus flertavam com a FC. 

Antonioni chegou a propor a John Kennedy a realização de um filme sobre o treinamento dos astronautas que se preparavam para ir à Lua, e Kennedy o convidou para ir à Casa Branca para conversar. O projeto não evoluiu, mas anos depois o livro de Tom Wolfe Os eleitos (“The Right Stuff”, 1979) deu origem ao filme homônimo de Philip Kaufman (1983).

Elio Petri, que viria a ficar famoso com Investigação Sobre um Cidadão Acima de Qualquer Suspeita, dirigiu em 1965 A décima vítima, adaptação de um conto futurista de Robert Sheckley em que indivíduos ricos e entediados se inscrevem num Clube onde podem matar vítimas sorteadas, e depois tornam-se vítimas eles próprios. 

Também de 1965 é Alphaville, um dos filmes mais inquietantes de Godard, em que ele pasticha a FC e o thriller policial ao descrever uma cidade futurista controlada por um super-computador.

Em 1966, foi a vez de François Truffaut embarcar na FC, adaptando Fahrenheit 451, o clássico de Ray Bradbury sobre uma distopia futura em que a leitura é proibida, as pessoas passam o dia vendo TV interativa, e cabe aos bombeiros queimar os livros que são lidos clandestinamente por dissidentes. 

Em 1968, Roger Vadim chamou sua então esposa Jane Fonda para estrelar Barbarella, adaptação dos quadrinhos de Jean-Claude Forest sobre uma astronauta sensual em aventuras eróticas pela Galáxia, num clássico do cinema “kitsch”. 

E no mesmo ano Alain Resnais, o “cineasta da memória”, dirigiu Eu te amo, eu te amo, onde uma experiência mal sucedida com uma máquina do tempo leva o viajante a ficar ricocheteando entre passado e presente, e revivendo uma história de amor mal sucedida que o levou a tentar o suicídio.

Há mais exemplos, mas estes bastam. Na década de 1960, estes jovens diretores do melhor Cinema de Arte europeu (todos então entre 30 e 40 anos) fizeram uma experiência com o cinema de ficção científica, experiência que não repetiram, mas que em todos os casos resultou em filmes dignos de atenção. 

Nessa década a FC começava a ser estudada nas universidades, e iniciava um diálogo com a vanguarda que esses diretores representavam. 

O rótulo de “New Wave”, dado à FC americana dessa época, foi uma adaptação explícita do nome de Nouvelle Vague usado pelos diretores franceses. FC e vanguarda tiveram ali um namoro breve, resultando em filmes cujo estudo conjunto ainda precisa ser feito.






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