segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

1567) Arthur C. Clarke (21.3.2008)



Às 20:30 de terça-feira, dia 18 de março, fiquei sabendo do falecimento do escritor Arthur C. Clarke, que tinha ocorrido à 1:30 da madrugada de quarta-feira, dia 19. Este aparente paradoxo temporal pode ser compreendido por quem já sabe que a Terra é redonda, que gira sobre si mesma, e que, como contamos os dias a partir da posição aparente do Sol, diferentes regiões do planeta têm horas diferentes e datas diferentes. Há 500 anos não era assim. Foram indivíduos parecidos com Arthur C. Clarke que descobriram o movimento da Terra, estabeleceram os fusos horários, criaram a linha internacional de demarcação de data, e assim por diante. É a função dos cientistas e dos escritores de ficção científica. Vivemos todos no mesmo mundo – mas no mundo deles já é amanhã.

A imprensa já está cheia de necrológios repassando os fatos mais notórios da vida de “Sir” Arthur. As dezenas de romances de FC, as centenas de obras de divulgação científica. A colaboração com Kubrick no filme 2001. Sua idéia dos satélites de telecomunicações (que teria feito dele um bilionário, caso a houvesse patenteado). Sua paixão pelo mergulho submarino, que o levou a morar no Sri Lanka nos últimos 40 anos. Poucos escritores do nosso tempo (e não falo apenas de FC) terão tido suas idéias discutidas tão a sério quanto ele.

Clarke não é um dos meus autores preferidos, e apenas por questões literárias. Acho seu estilo seco, descritivo, sem criação verbal; e acho seus personagens bidimensionais, todos parecidos uns com os outros. Mas o que lhe falta em riqueza estilística e profundidade psicológica lhe sobra em duas coisas também essenciais na FC: imaginação poética e conhecimento de como o mundo funciona. A ousadia e o gigantismo de suas idéias é incomparável; e a exasperante precisão com que prevê cada detalhe de ordem prática e consegue resolvê-lo satisfatoriamente já formou umas três gerações de escritores da FC “hard”, de Larry Niven a Greg Egan e a Charles Stross.

Meu livro preferido dele é Encontro com Rama (1972), em que nosso sistema solar é invadido por um objeto artificial alienígena, um cilindro de metal com 50 km de comprimento e 16 de diâmetro, que não responde a tentativas de comunicação. Uma nave terrestre está nas proximidades (isto se passa no ano 2131) e cabe a ela acoplar-se ao objeto para examiná-lo, antes que ele ultrapasse a órbita do Sol e desapareça novamente no espaço. O cilindro é oco; lá dentro existe todo um ecossistema, com sol, terra, continentes, oceanos, plantas. A exploração gradual desse mundo pelos astronautas é cheia de surpresas, mistério, ciência e poesia.

Numa entrevista à revista Locus em janeiro passado, perguntaram-lhe se ele gostaria de ser congelado para ser ressuscitado depois. Ele respondeu: “Em meu jardim, aqui em Colombo, estão os túmulos de vários dos meus animais de estimação que já morreram. Um dia, e espero que não seja logo, minhas cinzas serão depositadas junto às deles”.

Um comentário:

Paulo Rafael disse...

Coincidentemente, aquele objeto Oumuamua que passou aqui pelo sistema solar era cilíndrico.