domingo, 24 de janeiro de 2010

1564) Siba e a Fuloresta (18.3.2008)



Saiu o segundo CD do compositor pernambucano Siba, com seu grupo A Fuloresta do Samba. O título é um mote impecável: Toda vez que eu dou um passo o mundo sai do lugar. Os versos nos remetem à canção manguebit de Chico Science que dizia: “Um passo à frente e você não está mais no mesmo lugar”. É a base da estética alternativa, independente, da rapaziada elétrica das cidades grandes. A única maneira de mudar o mundo é com as próprias mãos, a única maneira de fazer o planeta girar é usando as próprias pernas. Como já previa Geraldo Vandré: “Mas o mundo foi rodando nas patas do meu cavalo...” É a filosofia da geração DIY, “faça você mesmo”, não fique de braços cruzados, cruzando os dedos, esperando que alguma coisa aconteça. Aconteça você mesmo as coisas.

Foi o que fez Siba quando se afastou do bem-sucedido grupo Mestre Ambrósio (que nunca encontrou uma gravadora à sua altura) e se transferiu para Nazaré da Mata para trabalhar com um grupo de músicos locais, batizado de Fuloresta do Samba a partir do título do seu primeiro CD conjunto, de 2002. A Fuloresta tem à frente Siba como principal compositor e vocalista, acompanhado por um naipe de sopros (sax, trumpete, trombone e tuba) e outro de percussionistas (tarol, mineiro, póica e bombo). O resultado é um som híbrido de bandinha de coreto, grupo de maracatu rural, cirandeiros de praia ou bloco de carnaval de rua. Metais rascantes, estridentes; ratatá permanente de tarol; vocais roufenhos a plenos pulmões; e por cima de tudo a voz limpa e serena do poeta, equilibrando-se entre as melodias suingadas e a prosódia clássica dos versos, como um acrobata que caminha sobre duas cordas-bambas paralelas.

Siba traz para a execução musical dos instrumentistas da Fuloresta um conceito mais profissional de organização de palco, de alternâncias, de formatos ensaiados que mantém o jeito pessoal de tocar de cada um, dentro de uma formatação de show que não surge como uma violência ou como uma pretensa “modernização”. Os músicos tocam daquele jeito. O som é aquele. Os formatos de canção são aqueles. A contribuição maior do compositor e vocalista principal me parece estar na organização dos arranjos e do repertório – o que é feito de acordo com sua experiência de estúdio e de palco – e principalmente nos versos, feitos com técnica impecável e inspiração constante.

Neste disco novo destacam-se os versos impagáveis do martelo sobre futebol, em cima do mote “Ninguém pode ganhar campeonato / se o juiz não tem mãe nem coração”; a hipótese, já explorada pela ficção científica, de “Será que ainda vai chegar / o dia de se pagar / até a respiração?”; a bela e minimalista canção de Biu Roque sobre a folha da bananeira, com um vocal arrepiante; o tom altivo de desafio em “Pisando em praça de guerra”. A poesia de Siba e a música da Fuloresta fazem uma combinação única, que não deve virar receita mas pode servir de exemplo.

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