segunda-feira, 2 de novembro de 2009

1343) O avião que não pousa (4.7.2007)



O sucesso é um avião que decola, com você dentro, e nunca mais pousa. Lembro-me deste aforismo todas as vezes que comparo as aspirações de um sujeito, no passado, com o que ele efetivamente veio a conquistar no futuro. É uma das ironias da vida. Ou você não tem sucesso, ou acaba tendo um sucesso muito maior do que pretendia, e ficando escravo dele. Como diz outra velha frase, “cuidado com o que você pede a Deus, porque ele atende”.

A revista Rolling Stone brasileira do mês de maio, com Darth Vader na capa, traz uma enorme entrevista com o diretor George Lucas, feita na época em que ele tinha acabado de lançar o primeiro filme da (agora) hexalogia Guerra nas Estrelas. Há duas coisas interessantes. Primeiro, o fato de que Lucas não tinha a menor idéia do espantoso sucesso que seus filmes iriam fazer. Lidas hoje, suas declarações parecem ingênuas e provincianas, mas se justificam, porque era num contexto em que filmes de ficção científica (hoje um dos pilares da indústria de Hollywood) eram execrados, porque não tinham público. E em segundo lugar, o fato de que Lucas, hoje, mantém praticamente as mesmas opiniões, embora a vida o tenha arrastado na direção oposta ao que pretendia.

Já comentei nesta coluna (“O evangelho segundo Lucas”, 3.6.2005) uma entrevista de Lucas à revista Wired em que ele dizia estar meio cansado de produzir super-espetáculos, e com vontade de fazer filmes parecidos com os filmes experimentais que fazia quando era estudante de cinema na Califórnia. Essa entrevista é de maio de 2005, e me fez ficar pensando em como um sujeito é arrastado pelo próprio sucesso numa direção que não previa. Em 1977, Lucas dizia: “Além do mais, também percebi que as vendas de produtos, junto com as seqüências, garantiriam uma renda suficiente para que pudesse me aposentar da função de fazer filmes profissionais e me dedicasse ao meu tipo de filme – às minhas coisas pessoais, bizarras, experimentais”.

Ou seja: em agosto de 1977 Lucas imaginava que os brinquedinhos de plástico associados a Guerra nas Estrelas vendessem apenas o suficiente para que ele não dependesse de fazer sucesso com outros filmes. Ledo engano. As miniaturas de Darth Vader e Han Solo são hoje uma indústria de bilhões de dólares. O pequeno estúdio de efeitos especiais criado para o primeiro filme da série transformou-se na Industrial Light & Magic, uma empresa gigantesca que produz e terceiriza efeitos especiais para o mundo todo. Lucas achava, há trinta anos, que um ou dois filmes de sucesso lhe dariam a chance de se aposentar e fazer o que gostava. Coitado! A espaçonave levantou vôo com ele dentro, e não parou até agora. Comparar as duas entrevistas, a da RS em 1977 e a da Wired em 2005 é ver a tragédia (uma tragédia bastante confortável, reconheçamos) de um cineasta que gostaria de fazer filmes “cult” e experimentais mas foi seqüestrado para sempre pelo próprio sucesso de biheteria.

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