sábado, 18 de julho de 2009

1163) Leopoldo Lima (5.12.2006)



Conheci este livro na Bahia, nos anos 1970. Leopoldo Lima, de Ribeirão Preto (SP), é o que eu chamo de “artista fora-de-esquadro”, ou seja, um sujeito que não se encaixa em definições ou escolas. O pessoal que o admirava dizia ser um “maluco beleza” que fazia uns desenhos e xilogravuras estranhas, meio surrealistas. Diziam que o filho mais novo dele se chamava Ôi, ou melhor, esse era o nome provisório que lhe tinha sido dado até que ele crescesse e escolhesse um nome para si próprio. O livro tem como título: 729 o varal biográfico embananado, ou pelo menos é isto que está escrito na capa, junto ao nome do autor, tudo em caixa-baixa (letras minúsculas). O exemplar que tenho hoje (comprado no Sebo Cultural de Heriberto) tem uma dedicatória do autor, para um tal de “Célio”, com um desenho e a data de 1970. 729 é o número da casa onde o artista morava (ou mora) em Ribeirão Preto, como se percebe pelas numerosas fotos no início e no fim do livro.

Leopoldo Lima faz um tipo de xilogravura cheia de traços retos ou sinuosos onde nenhum trecho da imagem é deixado em branco; lembra muito o estilo de cortar do cordelista e gravador Abraão Batista. Algumas imagens são recorrentes: crianças escuras, magras, fantasmagóricas; casas labirínticas; árvores retorcidas. Algumas fotos do interior de sua casa dão a idéia de uma mente atormentada e criativa, mas ao mesmo tempo pensamos: “como é que uma família com crianças mora num lugar doido como este?”. Um quadro intitulado “eu e voce” mostra um infinito corredor de tábuas, e em primeiro plano um sapato de homem sobre um sapato de mulher.

O texto em si são 60 páginas de linhas corridas, sem pontuação, numa fonte em negrito e itálico (mas legível), sem dar muita atenção à presença do til e de outros acentos. É um monólogo interior mas sem pretensões literárias, e neste aspecto lembra um pouco outro livro excêntrico de outro autor fora-de-esquadro, o lendário José Américo II, ou Zé Américo da Camionete, que em 1976 publicou em Campina suas memórias sob o espantoso título de Uma vitória dentro de uma derrota que não tive. Esta derrota foi a vitória do meu livro. Leopoldo Lima enfileira memórias, divagações, comentários sobre seus quadros, filosofias de vida, tudo isto sem recorrer sequer a um misericordioso ponto-parágrafo. Lembra as Galáxias de Haroldo de Campos ou o Catatau de Leminski, com a diferença que estes dois tentavam fazer Literatura, e Leopoldo faz um jorro de lava fumegante brotando pelas comissuras da mente.

Diz ele à página 42: “com este negocio do pessoal passar as maos nos quadros fiz um de um homem bebado caiu sentado com os pes para a frente descalço e no lugar havia uma garrafa de bebida quebrada sangravalhe o pe entao coloquei um caco de vidro cortante onde machucou as pessoas passavam a mao para ver se era caco de vidro pois parecia muito e de fato era cortavam a mao e coloriam mais o quadro”. Cuidado com a Arte, ela morde.

7 comentários:

Unknown disse...

Caro Braulio, boa noite.Gostei de encontrar seu post sobre o Leopoldo.Sou esse que estava sem nome a espera de escolher eu mesmo, hoje me chamo Fernando, acho que tive uma boa escolha.Gostaria de conversar com vc.Meu e-mail é fernando@fbfoto.com.br
Abraço.

Solimar disse...

Olá Braulio, sou de Ribeirão Preto me chamo Solimar , sou apaixonada pelas artes, desde menina tinha uma admiração pelos trabalhos do leopoldo Lima, sempre passava perto da casa dele para observar ele trabalhando na calçada, e via também os trabalhos expostos na praça XV. A figura dele sempre me chamou muito a atenção. Tanto que casei e coloquei o nome no meu primeiro filho de
leopoldo, hoje ele está com 24 anos.
Leopoldo Lima era um grande artista!!!
Abraços, Solimar.

Ana Maria disse...

Oi Braúlio
Sou da cidade de Jaú e estudei desenho e plástica na antiga Fundação Educacional de Bauru.
Eu mais uma amiga organizamos uma exposição de artes no ano de 1972 com artistas de nossa cidade e nosso convidado de honra foi ninguém mais que Leopoldo Lima.
Tenho até um pedaço de madeira aonde ele pirografou uma casinha.
Grande pessoa,grande artista.

Marcos A. Gonçalves disse...

olá tenho um quadro pintado por Leopoldo Lima datado de março de 1959,se alguem se interessar estou disponivel a negocia-lo,abraços Marcos.

Anônimo disse...

Oi Marcos, td bem? Me passe seu email para conversarmos. Voce pode mandar uma foto desse quadro?
abs

Unknown disse...

Muito interessante o comentário sobre o livro O Varal. Conheci o Leopoldo em 1987, ele só vivia de bermuda, sem camisa e descalço. Cabelos e barbas longas. Figura ímpar, o verdadeiro maluco beleza. Com este visual à la Gandhi ia a todo e qualquer lugar, inclusive a vernissage da exposição dele próprio. Tinha o hábito acocorar-se na calçada adiante da casa e, nesta posição, mirar o céu por horas a fio pela manhã. Me falou que o objetivo era receber nos olhos a salutar luz solar e, assim, limpar a vista das toxinas deixadas pela fumaça produzida pela pirografia.

Unknown disse...

Eu, Evandro da Costa Favacho, de Ribeirão Preto, escrevi o comentário acima.