domingo, 1 de março de 2009

0854) Meus Ateneus (11.12.2005)



Uma coisa que me chama a atenção nos colégios de hoje é o fato de que os garotos estudam sempre em turmas da mesma faixa etária. Um garoto ou garota de 13 anos que esteja na 6a. série, por exemplo, estuda ao lado de outros cuja idade varia de 12 a 14 anos, não muito mais do que isto. Um aluno de 15 ou 16 anos numa turma assim já seria considerado uma anormalidade. É claro que, no colégio como um todo, as idades se misturam no pátio, no recreio, nas atividades em geral. Mas dentro de cada sala de aula, onde passam a maior parte do tempo, é todo mundo “do mesmo tope”, como paraibanamente dizemos.

Pois, por falar em Paraíba, eu me lembro que quando eu tinha essa idade e cursava essa série (que então se chamava “segundo ano ginasial”) eu fazia parte de turmas onde havia alunos de 18 ou até 20 anos de idade. Por que isto? Há algumas razões sociológicas. Carência de escolas no interior, e quando as famílias se mudam para a cidade grande o filho está defasado. Índice de repetência alto: o sujeito leva dois anos na primeira série, três anos na segunda, os outros da mesma idade seguem em frente e ele fica estudando com garotos mais novos. E assim por diante.

Isto fazia com que nossas turmas se dividissem em dois grupos (os próprios professores usavam estes termos): “os grandes” (cerca de 20% a 30% da turma) e “os pequenos”. Com doze ou treze anos de idade eu disputava espaço (e comparava minhas notas escolares) com sujeitos que já tinham servido o Exército, que já trabalhavam, que tinham noiva, que freqüentavam a Zona, que bebiam, que fumavam... Muitos deles eram gente boa. Outros eram brutamontes que se impunham aos “pequenos” na base da ameaça física. Os recordistas de repetência tinham problemas com as matérias. Uns exigiam “cola” na hora da prova (“Me passa as respostas, senão vou te pegar na saída”); outros chegavam na véspera e pediam: “Vem cá, tu que sabe, me explica esse negócio aqui...”

Ouso afirmar que essa convivência me foi mais educativa do que as matérias em si, ensinando-me o mundo real, o jogo de política, violência e esperteza que eu iria encontrar na vida adulta. Sempre fui um dos “pequenos” e agradeço aos “grandes” as lições que recebi, mesmo sob a forma de um soco na cara. Foram úteis, e não foram esquecidas. Aprendi como o mundo funciona. Também tive lições de amizade, da parte de sujeitos tarimbados e malandros que juntavam os “pequenos” para explicar-lhes os mistérios da vida, desde o sexo até a bebida, desde ganhar a vida por conta própria até entrar sem pagar no campo do Treze. A convivência masculina nos colégios de então era mais áspera, por causa dessa mistura entre os profissionais calejados e os dentes-de-leite. Eu não a trocaria pelos guetos etários dos colégios de hoje, por mais que os educadores me convençam de que a fórmula atual é a mais indicada. Nos colégios em que estudei, vigorava a lei da Rua, ensinavam-se as lições da Rua, e sou-lhes grato por isto.

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