sábado, 21 de fevereiro de 2009

0825) Rosa Parks (8.11.2005)



Morreu recentemente nos EUA a mulher que desencadeou a briga pelos direitos civis dos negros, Rosa Parks. Em 1955 ela estava sentada num ônibus e recusou-se a dar o lugar a um passageiro branco, como a lei do Alabama obrigava a fazer. Mesmo pressionada, ela não foi sentar na parte traseira, destinada aos negros, e acabou sendo detida e sofrendo uma multa.

A lenda que corre é de que ela era uma mulher humilde que por sua iniciativa pessoal “bateu de frente” com a lei dos brancos. É apenas parte da verdade. Rosa era casada com um ativista negro; ela e o marido faziam parte da NAACP, a National Association for the Advancement of Colored People. No Sul dos EUA já tinham sido registrados vários casos de desobediência à segregação nos ônibus, mas os ativistas achavam que nenhum deles daria um “caso exemplar” para ser levado à Corte. No caso de Rosa, ela era uma mulher de 42 anos, instruída, politizada, e aos olhos do Pastor Martin Luther King era “uma das cidadãs mais exemplares da cidade”.

A recusa de Rosa Parks desencadeou um boicote aos ônibus que durou mais de um ano, e se prolongou por todas as lutas subseqüentes dos negros americanos. É o exemplo clássico de uma atitude individual que desencadeia um fenômeno de vastas proporções. Tem certos momentos na História em que basta um gesto de um único indivíduo para fazer com que milhões de pessoas, num único movimento, se mobilizem. É como quando a gente pega com a mão quente uma garrafa de cerveja super-gelada e ela se petrifica por inteiro numa fração de segundo.

Isto acontece num momento em que estes milhões de pessoas estão emocionalmente saturadas com o estado-de-coisas (no caso, a segregação racial); têm uma avaliação racional dos fatos: sabem por que aquilo acontece, e imaginam alternativas; e têm lideranças esclarecidas. Sem saturação emocional, entendimento e liderança é difícil mobilizar conscientemente uma multidão. (Para mobilizá-las não-conscientemente, basta o cardápio de sempre – tambores, bandeiras, discursos e hinos, que fazem a festa dos políticos, dos militares e das torcidas organizadas do futebol).

Algumas crises sociais fazem essa mobilização de maneira caótica, e o exemplo mais recentes são os quebra-quebras nos subúrbios de Paris, realizados por jovens filhos de migrantes, que se queixam de preconceito, desemprego, violência policial, hostilidade do governo. Basta olhar de longe e a gente percebe que essas pessoas sofrem pressões intoleráveis, e que existe uma compreensão unânime sobre o que está acontecendo. A violência cega explode porque faltam líderes esclarecidos (coisa que os ativistas negros americanos tinham de sobra) capazes de mobilizar essa força e derrubar leis injustas em vez de queimar automóveis e prédios. O episódio Rosa Parks é uma lição de História. A ação política bem encaminhada pode lidar com a violência potencial, e canalizar essa energia modificar leis, hábitos e conceitos.

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