segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

0718) Três casamentos (7.7.2005)


Três casamentos ocorridos nos últimos meses chamaram minha atenção, e não só a minha, porque a imprensa inteira não falou noutra coisa. Coluna social não é o meu forte, de modo que procurem ver aqui uma tentativa de exame antropológico dos curiosos rituais propiciatórios ao acasalamento em vigor na sociedade racionalista, cristã e ocidental.

O primeiro foi o casamento de Elias Maluco. Como? Vocês não leram nada a respeito? Pois na imprensa do Rio falou-se, e muito. Elias Maluco, que liderou o esquartejamento e carbonização do jornalista Tim Lopes, casou com alguém dias antes do seu julgamento num tribunal carioca. Poucos sujeitos aqui no Rio serão vistos com tanto desprezo quanto este patético bandido, e a defesa (ah, a imaginação dos advogados!) achou que casá-lo seria uma boa maneira de melhorar sua imagem, mostrar ao público que ele estava se regenerando... Não sei se chegaram a fotografá-lo com uma Bíblia evangélica embaixo do braço. Só o revi nas imagens pós-julgamento, quando, condenado, ele saiu dando-o-dedo para a câmara da Globo. (A Globo é um poder tão invasivo neste país que qualquer idiota sabe que basta agredi-la ou falar mal dela para angariar a simpatia de um naco substancial da população)

O segundo foi o casamento de Ronaldo & Cicarelli. No momento em que este artigo for publicado, talvez eles já estejam promovendo uma festa de reconciliação, com um regabofe para 2 mil convidados na Ilha de Caras; mas enfim, tenho que usar as informações disponíveis no momento. Poucos casais terão aceitado com tanto entusiasmo os rituais-de-fabricação da mídia. Ninguém pode questionar o futebol dele, a beleza dela, a simpatia espontânea e instintiva despertada pelos dois. Mas isto não basta. Compraram (coitados) todo o pacote de badalação, marketing, merchandising, feira-das-vaidades, consumismo, “potlatch” e perdularismo. O conto-de-fadas da mídia brasileira (e de fora) não durou três meses. (E recuso-me a ser o 328o. jornalista a usar metáforas envolvendo carruagens e abóboras)

O terceiro foi o casamento do Príncipe Charles e de Camilla Parker-Bowles, ao qual já me reportei aqui (“Pobre princesa feia”, 12 de março). Não tenho simpatia especial por nenhum dos dois. Dela sei muito pouco, e ele é uma figura patética, um cara com quase 60 anos mas que a mãe ainda não acha adulto bastante para ser rei. Paciência. Esse cara feio e bobão e essa mulher durona com cara-de-cavalo certamente gostam um do outro. Enfrentaram a antipatia e a perseguição impiedosa da imprensa, enfrentaram as leis, as convenções, enfrentaram o Império Britânico, as ameaças da Igreja, a desaprovação do povo inglês. Seguraram a barra por mais de 30 anos, e hoje estão casados. Ronaldo & Cicarelli? Michael Jackson & Lisa Presley? Tom Cruise & Katie Holmes? Não, amigos, já dei meu voto para O Casal do Século. Sou mais a Verdade do que a Beleza (“Verdade é Beleza”, 10.4.2003).

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