segunda-feira, 10 de março de 2008

0172) Godel, Escher e Bach (9.10.2003)



Perguntaram meu livro de cabeceira. Bem, na cabeceira da cama eu só coloco livros velhos que já li várias vezes, porque reler é mais tranquilo e aconchegante do que ler. Mas uma boa opção seria Godel, Escher, Bach – um Entrelaçamento de Gênios Brilhantes, de Douglas R. Hofstadter (Ed. Universidade de Brasília). Eu venho lendo este livro há mais de doze anos, e espero nunca terminar. É um livro inesgotável, não por causa de suas 800 páginas, mas porque envolve um número imenso de questões científicas, filosóficas e estéticas, e de ano para ano surgem fatos novos que abrem novas interpretações para o que ele diz.

É um livro que deve interessar a quem se interessa por: 1) o funcionamento da mente humana; 2) música barroca tipo “Cravo Bem Temperado”; 3) tradução de um idioma para outro; 4) perspectiva e falsa tridimensionalidade em artes plásticas; 5) inteligência artificial em computadores; 6) metalinguagem; 7) a mente coletiva dos insetos; 8) mapeamento das zonas do cérebro; 9) critérios de provas de teoremas matemáticos; 10) geração de sentido através de sinais abstratos; 11) os livros de Lewis Carroll; 12) sofismas e paradoxos filosóficos; 13) ordem vs. caos; 14) criptografia e codificação; 15) holismo vs. reducionismo; 16) geração da vida a partir da matéria inanimada; 17) “canons” e contrapontos musicais; 18) analogias e comparações verbais; 19) acaso e determinismo; 20) regressão ao infinito...

Vou parar por aqui, senão não tem artigo. Este livro ganhou o Prêmio Pulitzer em 1979, e desde então tem sido uma espécie de xodó dos estudantes e professores que mexem com alguns dos temas acima. Hofstadter tem uma abençoada característica, típica aliás dos cientistas norte-americanos: ele explica os assuntos mais difíceis como se nós estivéssemos ouvindo falar naquilo pela primeira vez na vida (e geralmente estamos). Daí, ele se dá o trabalho de esclarecer bem cada conceito, e só passa para o estágio 2 depois de ter certeza de que o estágio 1 ficou bem explicado. Além disso, tem um maravilhoso senso de humor, e é um grande trocadilhista. Os capítulos intermediários do livro são em forma de diálogos entre Aquiles e a Tartaruga, os dois personagens de um famoso paradoxo lógico do filósofo Zenão, e servem como ilustrações bem-humoradas dos problemas debatidos a cada capítulo.

O principal tema, segundo o autor, é um curioso fenômeno linguístico que ele denomina da “volta estranha” ou “hierarquia entrelaçada”. É o que ocorre quando um sistema tenta interpretar a si mesmo, ou quando obras de arte violam as próprias leis que propõem, ou um governo investiga seus próprios crimes, ou um dicionário usa na definição a própria palavra que está definindo... Todos estes casos parecem produzir um curto-circuito conceitual. A ciência e a filosofia do século 20 fizeram o possível para evitar (ou entender e superar) esses impasses. E não sei de uma tentativa melhor para entendê-los do que o livro de Hofstadter.

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